Atletas amadores colecionam histórias. Quero contar algumas na minha pista de treino que é a rua. Já fazem cerca de uns cinco anos que passei a me dedicar a corridas e já coloquei com orgulho em meu currículo três maratonas e participação em duas provas de Triathlon, mas o foco aqui são experiências vividas na rua correndo e que dizem bastante sobre nossa cidade e sobre como funciona o nosso trânsito.
A primeira delas é meio deprimente e nos dá um choque de realidade de saber onde vivemos. Em alguns casos eu preciso mostrar que não sou um ladrão. Isso mesmo. Sou apenas um ex-gordinho querendo ter qualidade de vida e quem sabe continuar me metendo em algumas competições. É impressionante a insegurança que vemos nas pessoas andando nas ruas. Ao me aproximar em ritmo acelerado e passadas fortes, muitas vezes assusto as pessoas e já me acostumei a pedir desculpas quando passo. Já até aprendi um truque: piso forte no chão e bato palmas leves para verem que sou um corredor, afinal de contas ladrão nenhum vai bater palma na hora de um ataque.
Além disso, há gente mal educada nas ruas que tocam o carro por cima, mesmo em uma faixa de segurança. Existem aqui três perfis de motoristas: o mal educado (não vou usar palavrão aqui mas dá vontade), o indiferente e o parceiro. Para saber em qual perfil se encaixa é só cruzar correndo em uma conversão onde há uma faixa de segurança. O primeiro, o “mal educado” (aquele das três letrinhas usadas para não falar um palavrão) acelera, converte na rua por cima de ti e ainda te xinga. O “indiferente” cumpre a norma se tu tiver iniciado a travessia, mas não vai além disso. O “parceiro” é o cara que alivia o acelerador e te ajuda esperando para que tu não perca o ritmo naquela cruzada de rua.
O corredor de rua é muitas vezes visto pelo motorista como um cara que está atrapalhando a vida dele. É lamentável uma visão dessas, mas muito corriqueira. Recordo de uma visita que fiz ao meu irmão que mora na Suécia. Ao sair para correr estranhei que as pessoas sorriam para mim. Paravam, obviamente, os carros nas faixas de segurança ainda que fosse a uma longa distância e até os pedestres abriam um sorriso e recuavam um pouco o corpo para que eu tivesse mais espaço na calçada. Não estamos acostumados com isso.
Mas há esperança. Vejo também, com alguma frequência, o pessoal correndo na Orla em um projeto chamado “Sexto Sentido”. Fui atrás de informações e descobri que é algo sensacional. Corredores voluntários funcionam como guia para deficientes visuais usando um elástico preso no braço do colega ajudando-o a conduzir pelo percurso. Que coisa linda e inspiradora.
Marcelo Roxo Matusiak
Jornalista e bacharel em Administração de Empresas
Diretor da PlayPress Assessoria e Conteúdo